A Ilusão da
Maravilha Constante
Numa manhã
envolta em nuvens, acomodei-me à mesa da cozinha, segurando uma xícara de café
fumegante. Contemplava, através da janela, as gotas de chuva que deslizavam
languidamente, enquanto minhas lembranças se desenrolavam em minha mente como
uma película vintage.
"É uma quimera imaginar que a vida se
mantém perpetuamente magnífica," refleti, relembrando os dias da juventude
em que sustentava a crença de que a felicidade incessante era o objetivo inato
de todos. Acreditava que a existência poderia se desenrolar como uma incessante
sequência de instantes luminescentes, assemelhando-se a um sol que jamais se
oculta.
No entanto,
ao longo dos anos, constatei que a realidade se mostrava significativamente
distinta. A vida, na essência, assemelhava-se àquele dia chuvoso: uma amalgama
de luz e sombra, de júbilo e melancolia. Recordava as adversidades que
enfrentei – a perda de entes queridos, os desafios profissionais e as
desilusões nas amizades – e como essas vivências me moldaram.
Sorrio ao evocar uma conversa com minha avó,
uma mulher de notável sabedoria que sempre conseguia descobrir a beleza nas
coisas mais simples. "Meu filho," ela proferiu, "a essência da
vida reside nas sutis maravilhas que emergem durante os momentos de serenidade
e satisfação, mesmo em meio às adversidades. "
Com essa
reflexão, iniciei a valorização de cada instante de tranquilidade, cada sorriso
trocado e cada ato de bondade surpreendente. Compreendi que não é a falta de
desafios que confere à vida sua magnificência, mas sim a forma como opto por
confrontá-los e descobrir a beleza nas situações do dia a dia.
A
precipitação persistia externamente, contudo, no âmago do meu ser, havia um
calor reconfortante. Ciente de que a vida não seria um fluxo incessante de
maravilhas, compreendi que isso não diminuía sua preciosidade.
Cada desafio
enfrentado e cada obstáculo superado enriqueciam a profundidade e o significado
da minha trajetória. Deste modo, ergui-me da mesa, pronto para encarar mais um
dia – não com a expectativa de uma incessante maravilha, mas com a gratidão por
cada diminuto milagre que surgisse em meu percurso.
Chagas
Barros
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